10 outubro 2006

Metade


  

"Que a força do medo que tenho não me impeça de ver o que anseio.

Que a morte de tudo que acredito não me tape os ouvidos e a boca.

Porque metade de mim é o que eu grito, mas a outra metade é silêncio.


Que a música que eu ouço ao longe seja linda, ainda que triste.

Que o homem que eu amo seja sempre amado, mesmo que distante.

Porque metade de mim é partida mas a outra metade é saudade.


Que as palavras que digo não sejam ouvidas como prece nem repetidas com fervor,

Apenas respeitadas como a única coisa que resta a uma mulher inundada de sentimentos.

Porque metade de mim é o que eu ouço, mas a outra metade é o que calo.


Que esta minha vontade de ir embora se transforme na calma e na paz que eu mereço,

E que essa tensão que me corrói por dentro seja um dia recompensada.

Porque metade de mim é o que eu penso e a outra metade é um vulcão.


Que o medo da solidão se afaste, que o convívio comigo mesmo se torne ao menos suportável

Que o espelho reflicta em meu rosto um doce sorriso que eu me lembro de ter dado na infância.

Porque metade de mim é a lembrança do que fui, a outra metade eu não sei...


Que não seja preciso mais do que uma simples alegria para me fazer aquietar o espírito.

E que o teu silêncio me fale cada vez mais.

Porque metade de mim é abrigo, mas a outra metade é cansaço.


Que a arte nos aponte uma resposta, mesmo que ela não saiba, e que ninguém a tente

Complicar porque é preciso simplicidade para fazê-la florescer.

Porque metade de mim é plateia e a outra metade, é canção.


E que minha loucura seja perdoada.

Porque metade de mim é amor e a outra metade... também...


Oswaldo Montenegro"



 

0 Coment�rios: